7.12.14

Outros Natais




Durante muitos anos vivi o Natal entre duas tradições,a da Beira Alta e a do Algarve.A minha Mãe que era da zona da Covilhã embora viesse viver para Lisboa em pequena,o meu Pai era de Faro e veio também para Lisboa em pequenito.Mas os costumes ficaram,e embora não me lembre como eram os natais passados com os avós maternos porque faleceram quando eu tinha quatro ou cinco anos,já com os avós paternos,que nos acompanharam por longos anos,as memórias ficaram bem retidas e guardadas no coração.A minha Avó era uma pessoa bem disposta e adorava tudo o que podia dar uma boa festa,assim não havia celebração que não fosse festejada assim como o meu Pai que também ele tinha esse espiríto festeiro. Quando chegava a época do Natal os meus avós vinham mais cedo para a minha casa para se preparar tudo para o dia de Natal(embora eles vivessem em Lisboa,na Estefânia e nós em Benfica,portanto a meia hora uns dos outros).Nessa altura faziamos a ávore de Natal a dia 8 de Dezembro,era a tradição era também o dia em que a minha bisavó paterna fazia anos,o que significava que era mais um dia em Dezembro para lembrar(a bisavó morreu com 99 anos já eu tinha 12 ou 13 anos),nesse dia íamos sempre almoçar com ela e era ela que gostava de fazer um cozido muito especial,que não levava água,tudo era feito com o suor dos próprios legumes e carnes e que era um segredo de família.A minha bisavó tinha sido professora no Algarve e por hábito depois do almoço contava sempre as histórias dos seus alunos que eram poucos naqueles tempos em que tinha lecionado. Mas voltando ao meu Natal de criança,depois de enfeitarmos a árvore que era natural(eu sei um crime hoje em dia,mas era tão bom o cheiro a pinheiro dentro de casa...)que dava sempre motivo para brincadeira porque não era só eu e o meu irmão a enfeitá-la como o meu Pai dava os seus palpites e contava sempre uma história sobre.."aquela estrela foi comprada quando a tua irmã nasceu e aquele sino foi do ano em que tu nasceste(dizia o Pai ao meu irmão Carlos),vês aquele sino maior? pois foi para a ávore que o pai e a mãe fizeram a primeira vez depois de casados..." tudo tinha magia e nós olhávamos para tudo como se fossem tesouros ali colocados.Depois na véspera era uma noite especial,faziam-se as coisas boas que nós tanto gostávamos,o arroz doce desenhado com canela que o meu irmão tanto gostava( eu rapava a panela enquanto estava quente),o pão-de-ló feito pela Mãe que era o melhor do mundo,o bolo-rei(nesse tempo com fava e brinde),os bolinhos algarvios feitos com canela e erva doce,os sonhos fofinhos,e as filhós feitas pela mãos doces da Mãe,e os figos,as nozes,etc,etc,era mesmo uma grande festa familiar porque além de nós algumas vezes,juntavam-se tios e primos e amigos.Depois,depois vinha o dia de Natal e a abertura das prendas,porque nesse tempo era no dia de Natal que abríamos as prendas e também era (na minha casa) o Menino Jesus que nos enviava as prendas através dos nossos Pais tendo- lhes contado como nós nos tínhamos portado durante o ano inteiro,até podíamos fazer asneiras desde que não fossem muitas.Coisas boas,muito boas.E assim passei a minha infância,a minha adolescência até que a minha avó morreu e o meu Pai entristeceu  e o Natal nunca mais foi igual.Passámos a ir celebrar o Natal com os meus tios e hoje penso que o meu Pai fugia de casa para não se lembrar daqueles tempos felizes.Durante muitos anos os Natais foram assim menos felizes até que o meu filho nasceu e começámos novamente a recriar os hábitos antigos.A ávore passou a ser feita no início de Dezembro,explicando que aquela estrela tinha sido comprada pelo Avós quando a mãe nasceu,o sino do tio estava na casa dele,e aquele ali já vinha da primeira ávore que os Avós enfeitaram na casa deles,e estes enfeites todos foram para a primeira ávore de natal do João.As filhós passaram a ter um ritual,a Mãe dizia o que se punha na massa,o Luís amassava,a Mãe fritava-as  e eu punha-lhes o açúcar e a canela.Já não se fazia tanto doce mas a festa era a mesma,e vinha a nossa casa quem quisesse.As prendas passaram para a noite de Natal e era o pai natal que trazia,pela chaminé,pela porta ou pela janela dependia de onde o João estivesse,e acontecessem ou não asneiras durante o ano as prendinhas chegavam sempre.E foi assim com muito amor até que o meu Pai partiu e tempo depois a minha Mãe morreu num dia de Natal.E mais uma vez o Natal nunca mais foi igual.Mas tentámos,nós os três fazíamos a festa,as filhós continuaram a ser feitas,agora com outro novo ritual,o Luís preparava e amassava as filhós,eu fritava-as e o João passáva-as por açúcar e canela.A árvore era feita por mim,relembrando as velhas histórias em silêncio.As prendas,menos,eram abertas pela meia noite de dia 24 e assim terminava o Natal porque o outro dia passou a ser triste mesmo que estivéssemos juntos no almoço familiar.Este ano ainda não fiz a ávore,não me apetece.Não enfeitei a casa,não tenho vontade.Possívelmente não farei as filhós.O Natal nunca mais será o mesmo.